14.10.10

Assis e o que ninguém quer ler.

Quase meio dia, quando chega esse horário sei que minha mulher vai me chamar para o almoço. Meio dia, ela me chama, juro que dentro dela, além de uma pouca indignação, não existe nada que me condene. Frango ao molho, relevo o fato dela viver comigo a mais de trinta anos, filhos, netos, não devo nada a nenhum deles. Casamentos, sempre parecem felizes. Frango ao molho, limpo a boca com guardanapo de papel, bebo água. Levanto da mesa palitando os dentes, a gente não pode desperdiçar carne, nunca se sabe quando vai passar fome. Quinze pra uma, não me preocupo com ela no bar, nunca deu problema. Sei que ela pega dinheiro do caixa, um agrado. Digo que vou dar uma volta, ela sabe pra onde vou. Consente com uma ligeira aprovação, olhando pra baixo. Trinta e dois anos, acho que é isso, muitas coisas são engolidas nesse meio tempo, tanta coisa. Ligo o carro, existe um quê de poder nas caminhonetes, a cabine elevada, você mais alto que todo mundo. Só Deus sabe o que é. Ouvindo sertanejo, dirijo devagar, moda de viola. E aqueles moleques drogados pensam que a porcaria que ouvem é música. Santo Inácio não tem puta que preste, e mesmo se tivesse, prefiro deixar escondido. Já Santa Fé, é o paraíso no mundo. Dirijo devagar, não gosto de chamar a atenção da polícia. Pra que levar uma multa à toa? Um sol filho da puta racha a cabeça, faz eu suar. Vejo a cidade de longe, se aproxima devagar. Ela diz "Vem aqui.", e eu vou, vou sorrindo pra ela. Dentro da calça, meu garoto vai crescendo, tomando força. É, menino, tá chegando a hora de brincar. Yvette me espera toda quarta feira, ela sabe, eu sei. Encosto o carro na frente da casa de Yvette, não preciso mais de cerimônia, quatros anos e três meses venho aqui. Quatro anos, três meses. Ela mora com três filhos, graças a Deus, nenhum meu. Buzino, ela vem arrumada, sorrindo. Decote, shortinho, trinta e dois anos. Yvette, até que você não é mal negócio. Yvette enfia a língua na minha boca, a coxa quente. É, menino, tá chegando a hora de brincar. Dirijo, dessa vez vou depressa, meu coração acelera, eu sempre fico assim na hora de trepar, desde moleque, desde moleque... Dallas Motel, nomes estrangeiros excitam, entro pelo portão e agora sou um cowboy. Na cama, Yvette geme, não sei se é falso. Yvette, quem me fode é você. O ar-condicionado não adianta porra nenhuma, não paro de suar. Boto ela em cima de mim, de quatro não dá nesse calor. Dez minutos, me sinto gozar. O único motivo de viajar uma hora, numa quarta feira, depois do almoço. Fico deitado, Yvette não seria idiota de dizer uma palavra, agora vem o peso na consciência. Trinta e poucos anos de casado, filhos, netos. Todos me olhando com aquela cara de bunda: "Assis, você não tem vergonha?". O caralho que tenho. Olho pra Yvette deitada, Rosa no bar, eu aqui. Na novela existe um casal filho-da-puta de bonitinho. Eu cago pros dois. É mentira, tudo mentira. Ele é um retardado, ela, uma biscate. Minha vida é um vômito ácido, amarelo e viscoso, não existe nada além de um amor pago, de uma gozada transcedental e a minha mulher conformada abaixando a cabeça e dizendo: "Vai com Deus". Eu vou, mesmo.
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Blandest e Oh, The Guilt. Podre, podre, podre.

6 comentários:

  1. já ouvi falar bem, mas nunca li. tá entre os autores das férias (:

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  2. uiiiii....yvete...rosa....ja assistiu um filme chamado historias de amor duram apenas noventa minutos......?

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  3. também não... tô me sentindo sem o direito de escrever, parece que minha cultura artística é um lixo .-. mas "histórias de amor duram apenas noventa minutos" seria um bom título de post se não fosse o de um filme, já.

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  4. "Nomes estrangeiros excitam", uhahuahua, muito boa.
    "não existe nada além de um amor pago" é uma bela definição pro amor =]

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