7.10.10

Cagando Amor.

Maputo, 22 de Fevereiro de 1994, Moçambique.

Amanda,
escrevo hoje, porque sei que é seu aniversário, e porque hoje o dia foi calmo no trabalho, logo, deu tempo de vir em casa tomar um café. As coisas por aqui vão muito bem, e em cinco ou seis meses voltarei pro Brasil. À tarde, quando as pessoas voltam do trabalho, eu fico a olhá-las da janela e imagino se você também pensa em mim às seis horas da tarde, fumando um cigarro ou conversando com alguma amiga. Embora eu saiba que quando aqui são seis horas, aí deve estar perto das onze e você provavelmente já está indo se deitar. Não passo um dia sem olhar nossas fotos, penso em seu sorriso, e em como ele é bonito, bem mais bonito que a moça da propaganda de margarina, e olha que eles pagam muito bem pra ela sorrir. Sinto falta da sua respiração calma na minha nuca, enquanto esperava o sono chegar. E dos domingos de grama verde, óculos de sol e suco de abacaxi. Aqui não tenho saído tantas vezes, quando muito vou no mercado comprar alguma coisa pra comer, vejo as mulheres daqui, e mesmo as que instigam qualquer homem (inclusive a mim) não se comparam a você. Desde Novembro faz um calor desgraçado, e eu pensava que o Rio que era quente, esse tempo seco dá raiva, já tô quase me arrependendo de ter aceitado vir parar aqui. As pessoas de Maputo e Manhiça são felizes, mas sempre com aquele ar de desconfiança quando conversam com um homem branco, eu as entendo. Mas me sinto desconfortável e bem deslocado da minha vida de antes. Lembro das vezes que você brigava comigo por deixar a carne queimar ou o leite derramando, odiava ouvir suas reclamações, hoje tenho tanta saudade da sua voz que se pudesse a ouvir pessoalmente, se você dissesse qualquer coisa desconexa, que nem, sei lá, "ferro, aranha, ergométrico", seriam palavras suficientes pra me fazer muito feliz. De vez em quando paro pra beber cerveja no bar do hotel, mas ela é cara e aguada, o barman fala num português quase incompreensível, e ele não para de falar. "Coôfoodiassenhô?", o caralho pro meu dia, ele nem se importa com isso de verdade. Em contrapartida, ganhei uma garrafa de black label do Henrique (lembra dele?), e essa tem gerado meus minutos de paz de cada dia. Fora isso, não sobra muita coisa. Devia ter te ouvido, e nunca ter-me inscrito naquele curso de relações internacionais - "Enfermagem, Rodrigo!" - você dizia e eu não tava nem aí. Tudo está se reestruturando muito lentamente, mas eu espero de verdade que as coisas se acertem o mais rápido possível. O pessoal daqui bem que merecia um pouquinho de paz. No mais, fiquei doente semana passada, deve ter sido alguma porcaria que comi na rua, vomitei até as tripas, mas já me recuperei. Deve fazer mais ou menos um ano que não nos vemos, tô sentindo muito sua falta aqui. Quero te ver o mais rápido possível, e prometo que você será a primeira pessoa que vou procurar quando chegar no Brasil. Juro que não vou demorar, e esses seis meses vão passar num pulo, pelo menos espero que passem pra você.
Com açúcar e com afeto,
Rodrigo.

P.S. Não me masturbei nenhuma vez pensando em ti, porque me sinto sujo fazendo isso.
P.S.2. Te adoro.
P.S.3. Fala pra Jaque que mandei um abraço e que tô com saudade dela também.
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Pace is the Trick. E muito boa noite.

11 comentários:

  1. uhauhauha, "Ferro, aranha, ergométrico"
    no fim acho q vc quis dizer peace né?
    Adorei.

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  2. gostei da parte que citou a masturbação, mas o texto em si é uma beleza (ou não, libriano viado)

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  3. cara cafezinhos e cigarritos e lembrar-se da pessoa e eperar que ela se lembre de vc....e a parte da masturbação hasuahsuahsuahs
    enfim amei...aliass seus textos são bons....
    bjo

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  4. enquanto ele escreve essa carta de amor simpática, essa moça tá traindo ele, certeza.

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  5. e, poxa, é melhor ele se masturbar pensando nela do que em outras. ou ele vai ficar um ano sem tocar punheta?

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  6. Concordo, haueheauhea
    Mais sujo seria transar com outras.

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  7. 1 - é, lory,não faz muita diferença, mesmo, é pela paz que a voz traz aos ouvidos.
    2-tiago, seu texto leonino também é lindo
    3- brigado, mayra ;) acho que o contexto cigarros, é a única coisa que diz de verdade respeito a mim.
    4 - Talvez ela esteja traindo ele, mas, desde que ele não saiba, isso não faz diferença pra o que ele sente, ou pras cartas que ele escreve. E, não... se masturbar pode ser bem mais aceitável quando não pensando em quem se ama, as atrizes pornôs não lembram carinho e amor, acho que é mais ou menos isso...
    5 - Kriska, ele não tava transando MESMO.

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  8. enquanto lia também pensei, "enquanto ele escrevia a carta ela devia estar transando cm outro". Enfim, ficou ótimo freak!

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  9. Eu disse que estava?

    Mas sexo e masturbação são completamente diferentes, já que você pensa que estou falando dele, ele poderia fazer sexo e não se sentir sujo, porque afinal, ele pode fechar seus olhos sem se lembrar dela.

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  10. nossa, isso parece os meus relacionamentos virtuais, e você chama de cagando amor, hauhauhauha,
    porque você duvida da felicidade da atriz do comercial de margarina o.o
    vo indicar uma musica aqui tb, wild wild love, talking heads

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  11. cagar amor, é porque é tanto, que chega a se cagar ele...

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